Entrevista com o Prof. Dr. Alexandre Quadros em relação à comparação entre os estudos NOBLE e EXCEL
O estudo NOBLE evidenciou conclusões diferentes em relação ao estudo EXCEL. Por que o senhor acha que houve tais diferenças?
Existem algumas diferenças entre esses dois importantes estudos que podem ajudar a entender os seus resultados. A primeira delas é a questão dos desfechos. O estudo EXCEL optou por incluir na definição do desfecho primário os eventos duros (morte, infarto, AVC) e não revascularização miocárdica, enquanto que o estudo NOBLE incluiu os eventos adversos de revascularização miocárdica. Mas quando se avaliam os desfechos secundários do estudo EXCEL, a revascularização miocárdica também foi incluída e então se observou maior taxa de eventos no grupo ICP (intervenção coronária percutânea). Portanto, trata-se de uma semelhança entre os estudos, embora no estudo NOBLE tenha ocorrido um número maior absoluto e percentual de revascularizações em relação ao estudo EXCEL.
Foram também observadas diferenças entre as populações de pacientes. No estudo NOBLE, 80% dos pacientes apresentavam angina estável versus apenas 60% no estudo EXCEL, o que poderia ajudar a explicar os resultados, uma vez que os pacientes com síndromes coronárias agudas apresentam melhores resultados quando tratados por ICP. Outra diferença foi o tipo de stent utilizado nos estudos. No estudo NOBLE, 11% dos pacientes foram tratados com stent Cypher. Sabe-se que esse stent apresenta maiores taxas de trombose em longo prazo, como evidenciado em estudos clássicos, em que a taxa de trombose com esses stents aumenta 0.5% ao ano, justificando a maior taxa de trombose no estudo NOBLE em relação ao EXCEL. Além disso, o estudo NOBLE também utilizou o stent Biomatrix, que não é considerado um stent de última geração, nem tanto pelas taxas de trombose, mas porque apresenta hastes muito espessas quando comparado ao stent utilizado no estudo EXCEL (stent Xience, eluidor de everolimus) e outros stents de última geração. Provavelmente, essa talvez seja a principal diferença entre os estudos.
É importante ressaltar também que o estudo NOBLE apresenta um alto índice de AVC em pacientes tratados com ICP. Apesar de não apresentar significância estatística, esse é um dado muito discrepante em relação a todos os estudos anteriores e também em relação à base fisiopatológica, pois os pacientes tratados com cirurgia de revascularização miocárdica (CRM) geralmente apresentam maiores taxas de AVC em relação aos tratados com ICP. Este é um dado que traz preocupação, pois levanta a hipótese de que o estudo NOBLE tenha diferenças significativas com os outros estudos anteriores e também com os pacientes tratados na prática clínica diária. Uma possibilidade é que os pacientes do estudo NOBLE apresentassem um maior estado pró-trombótico, já que também apresentaram maiores taxas de IAM, trombose de stent e de AVC.
Para transportar esses resultados para a prática clínica diária, os pacientes com lesão única de tronco, sem lesões em outros vasos, apresentam resultados de ICP no mínimo equivalentes à CRM. Existem dados recentes de um estudo publicado no JACC com uma análise conjunta dos estudos SYNTAX e PRECOMBAT, realizado pelo grupo de Roterdã e como autor principal o Dr. Rafael Cavalcante, demonstrando que o tratamento das lesões isoladas de TCE ou que também envolviam apenas 1 vaso por ICP reduziu mortalidade quando comparado à cirurgia. Portanto, na minha opinião, quando a complexidade das lesões é grande, a CRM ainda é o procedimento de escolha. No estudo EXCEL, os pacientes com SYNTAX escore alto foram excluídos, e no estudo NOBLE, esses pacientes foram minoria, portanto essa é uma variável que não pode ser avaliada nesses estudos. Os pacientes triarteriais com disfunção miocárdica e os pacientes diabéticos comprovadamente apresentam melhor evolução com o tratamento cirúrgico, de acordo com estudos anteriores.
Por último, a localização das lesões de TCE também é importante. As lesões de TCE únicas ostiais ou em seu corpo apresentam melhores resultados com o tratamento por ICP e a luz dessas novas evidências, como no grande estudo EXCEL, demonstra-se esse fato. Nos pacientes com lesões de bifurcação, devem-se estratificar critérios anatômicos, como o tipo de lesão, a presença de calcificação, o envolvimento e calibre da artéria circunflexa, o tamanho da coronária direita, presença de trifurcação, etc. Em um ensaio clínico, é difícil que todas essas variáveis sejam avaliadas.
Fonte:Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista
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