sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Ultrassom é novo aliado no combate

à insuficiência cardíaca

Pesquisa realizada no Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul demonstra forma mais precisa para detectar água no pulmão

A sensação é de estar afogando, mesmo em terra firme. É esse o drama relatado por pacientes com água no pulmão (edema pulmonar), problema que pode levar à morte e que, frequentemente, está relacionado à insuficiência cardíaca. Não bastasse a aflição gerada pela falta de ar, há um agravante: os sintomas do edema pulmonar só aparecem quando o caso já é grave, muito depois do momento ideal de intervenção. Infelizmente, a detecção precoce esbarra na pouca precisão dos métodos utilizados atualmente, como o exame clínico tradicional com o estetoscópio e o raio-X.
Em busca de uma alternativa que permitisse diagnosticar o problema o mais cedo possível, o cardiologista Marcelo Haertel Miglioranza adotou uma arma bem mais eficiente: o ultrassom portátil. Em sua pesquisa de doutorado no Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul, ele acompanhou 97 pacientes. Destes, cerca de 10% receberam o diagnóstico de água no pulmão após passar por uma avaliação médica tradicional. O exame com ultrassom trouxe, porém, um cenário bem mais preocupante: 67% dos pacientes examinados já estavam com edema pulmonar.

Entre cinco exames, ultrassom foi o mais eficiente

O trabalho comparou os resultados obtidos com o ultrassom àqueles provenientes da avaliação com estetoscópio, raio-X, ecocardiograma, questionário sobre qualidade de vida e teste de caminhada, assim como a um exame de sangue voltado à detecção de uma substância liberada pelo coração quando ele trabalha sob pressão muito elevada (peptídeo natriurético). A meta era descobrir qual desses exames era capaz de prever os pacientes com mais risco de ser internado e morrer em um período de quatro meses. “Foi constatado que o ultrassom, por ser mais específico, era o método de maior valor preditivo, permitindo detectar o problema mais precocemente”, afirma Miglioranza.

A descoberta pode ter um impacto significativo, já que a insuficiência cardíaca é uma das principais causas de internação por doenças do coração no Brasil. O problema, que atinge 10% das pessoas com mais de 60 anos, foi responsável por trezentas mil internações pelo SUS em 2015. Além disso, apresenta um alto índice de mortalidade: só 30% dos pacientes conseguem viver mais de cinco anos com insuficiência cardíaca.

Ultrassom no atendimento ambulatorial

No Brasil, a doença está muito relacionada à hipertensão arterial. Quando o paciente não recebe o tratamento adequado, seu coração vai perdendo a força necessária para bombear o sangue da maneira ideal. Por isso, parte dele fica represada na circulação pulmonar e acaba atravessando a parede das veias, indo se instalar no tecido do pulmão. Esse acúmulo de água impede que o ar chegue até o sangue – e o nível de oxigenação cai. “É um quadro de evolução gradual e lenta, no qual o paciente procura a emergência quando já não consegue mais respirar, momento que às vezes é tarde mais”, diz o médico.

Segundo ele, o ultrassom já vem sendo usado para diagnosticar se a falta de ar  de pacientes que chegam à emergência se deve ao edema pulmonar ou a outro fator. A novidade de sua pesquisa é mostrar que o aparelho pode ser usado antes, no atendimento ambulatorial. Identificado precocemente, o problema pode ser tratado com ajuste da medicação, composta, de modo geral, por diuréticos (que ajuda a eliminar a água em excesso do organismo) e vasodilatadores (que aliviam a pressão ao aumentar o calibre dos vasos sanguíneos).

“Hoje, o ultrassom portátil está ficando mais acessível e presente nos hospitais, sendo usado cada vez mais como um novo estetoscópio”, afirma Dr. Marcelo Miglioranza, que utilizou em sua pesquisa o Vivid I, da GE Healthcare. Segundo ele, a meta agora é realizar um estudo clínico randomizado, no qual dois grupos de pacientes serão acompanhados. Um deles será avaliado e tratado a partir do resultado obtido por meio dos métodos tradicionais, enquanto o outro será examinado e tratado a partir dos dados provenientes do exame com ultrassom. “Vamos ver, ao longo do acompanhamento ambulatorial, qual desses grupos tem menos internações. Se mostrarmos o benefício do ultrassom, isso ajudará a consolidar o uso do ultrassom portátil no dia a dia”, finaliza.


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